Sabe aquela cena em que uma mãe, precisando ensinar algo ao filho pequeno, prefere contar uma história em vez de dar uma lição direta? Intuitivamente, essa mãe está usando a técnica de storytelling.
Essa maneira de transmitir conhecimentos por meio de histórias é provavelmente a mais antiga forma de ensino e aprendizado dominada pelos seres humanos.
Embora tenha estado conosco praticamente desde sempre, o storytelling tem sido “redescoberto” e bastante estudado nos últimos tempos. E casa perfeitamente com o marketing de conteúdo.
Em um experimento realizado pela Buffer, um mesmo conteúdo no blog da empresa foi apresentado de duas formas ao público: com história e sem história.
A versão com história obteve 296% a mais de leituras completas e 520% a mais de tempo do visitante na página.
Esse é só um pequeno exemplo do poder que a técnica de contação de história tem para aumentar o engajamento da persona com o seu projeto.
Nesta aula, que continua a etapa “Produzindo Conteúdo” do curso Presença Digital de Zero a Dez, vamos ver em detalhes:
- Como o storytelling deve ser usado na sua produção de conteúdo
- As 6 características de um bom storytelling
- Joseph Campbell e a teoria do monomito
- A Jornada do Herói: a estrutura básica de todas as histórias
- Como aplicar a jornada do herói em suas histórias
- Como aprender storytelling como um verdadeiro mestre
Comecemos com algumas definições básicas.
Como o storytelling deve ser usado na sua produção de conteúdo
Se você está seguindo as tarefas desta terceira etapa do curso, já escolheu um tema sobre o qual vai produzir o conteúdo. Já sabe as palavras-chave que vai explorar. E já realizou uma pesquisa com o melhor conteúdo existente na internet sobre o assunto selecionado.
Agora você pode simplesmente começar a produzir o conteúdo em forma de um texto direto. Ou pode turbinar os seus resultados utilizando técnicas de storytelling.
Dependendo do seu nicho de mercado, é difícil produzir um conteúdo inteiro baseado em uma história. Então, você deve ao menos se focar em começar o seu conteúdo contando alguma boa história.
Uma boa história tem o poder de firmar uma conexão entre o produtor de conteúdo e seu público-alvo. Também aumenta as chances de a persona concluir a chamada para ação que você definiu na Tarefa #21.
O motivo disso, segundo os estudiosos, é que o cérebro humano está acostumado, há milhares de anos, a escutar histórias e aprender por meio delas. É basicamente a nossa forma natural de aprendizado.
Praticamente toda a indústria do entretenimento (cinema, televisão, teatro, games, até música) consegue a atenção de milhões de pessoas e gera outros bilhões de dólares em cima da construção de boas histórias.
No marketing de conteúdo, a técnica é ainda mais interessante por permitir a criação do sentimento de comunidade que faz com que a obtenção de retorno torne-se natural.
As 6 características de um bom storytelling
Dependendo do posicionamento de mercado que você adotou na Tarefa #5, seu projeto pode se basear em histórias próprias suas, pessoais, ou em narrativas de terceiros.
Seja qual for o caso, é preciso atentar para escolher e produzir histórias que tenham as seguintes características:
- Boa narrativa: aquela que pensa mais no interesse do público do que na vaidade do autor.
- Estrutura narrativa familiar: geralmente dividida em três atos – a normalidade, o acontecimento que leva a uma mudança e a nova normalidade.
- Personagens que geram conexão com o público: imperfeitos, que falham mais do que acertam até aprender a lição. O ideal é que o protagonista compartilhe características da persona do seu projeto, para facilitar a identificação.
- Exploração de múltiplos sentidos: seja por meio do texto ou, no caso da web, com o uso de recursos multimídia (imagens, vídeos, infográficos, áudios etc.)
- Intertextualidade: usando de metalinguagem e fazendo referência a personagens ou acontecimentos de domínio público, você enriquece sua história sem aumentar o tamanho dela.
- Forte mensagem: a mensagem de fundo, a lição da história, precisa ficar clara mesmo que não seja explicitamente escrita durante a narrativa.
Momento jabá absurdo: eu gosto de exercitar as técnicas de storytelling escrevendo pequenos contos e crônicas, que você pode conferir no link Micrônicas.
Joseph Campbell e a teoria do monomito
Quando se trata de storytelling, um estudioso se destaca entre todos os demais: Joseph Campbell, autor de O Herói de Mil Faces.
Publicado pela primeira vez em 1949, a obra-prima de Campbell levanta a teoria de que histórias importantes de todo o mundo que sobreviveram durante milhares de anos compartilham uma mesma estrutura fundamental, o chamado monomito:
Um herói se arrisca a sair do seu dia-a-dia comum para uma região de maravilha sobrenatural; forças fabulosas estão lá para ser encontradas e uma vitória decisiva está a ser ganhada; o herói volta a partir desta misteriosa aventura com o poder de conceder bênçãos sobre seus companheiros. ~ Joseph Campbell em O Herói de Mil Faces
Nas pesquisas para o livro, Campbell percebeu que mesmo culturas primitivas e que nunca tiveram contato umas com as outras partilhavam estruturas de histórias muito parecidas.
Essas estruturas parecem ter ressoado e sobrevivido por tanto tempo por fazer muito sentido para o cérebro humano.
Segundo o autor, as histórias religiosas foram algumas das que mais se utilizaram do monomito. Osíris, Prometeu, Buda, Moisés, Maomé e Jesus são alguns dos arquétipos explorados no livro.
O trabalho de Campbell, considerado pela Revista Time como um dos 100 livros mais importantes já escritos, influenciou toda uma geração de criadores de conteúdo.
Exemplos famosos
O exemplo mais famoso é o de George Lucas, que se utilizou da estrutura da jornada do herói para criar a história de Luke Skywalker na trilogia original de Star Wars.
Avatar, de James Cameron, é um dos filmes de maior bilheteria de todos os tempos e segue à risca a estrutura observada e revelada ao mundo por Campbell.
Se essa estrutura é assim tão poderosa, então o melhor que você pode fazer como produtor de conteúdo é estudá-la e dominá-la para adaptar ao seu projeto e alavancar os seus resultados.
A Jornada do Herói: a estrutura básica de todas as histórias
A estrutura da jornada do herói não é tão pragmática como fazem crer esquemas resumidos na internet, inclusive nesta aula.
Para explicar suas bases e variações, Campbell gastou mais de 400 páginas em O Herói de Mil Faces.
Por isso, tome este resumo como um ponto de partida e procure ler o livro para entender melhor a teoria do monomito.
A estrutura básica da jornada do herói divide-se em três atos:
- Partida: é o início da história, em que se apresenta o mundo cotidiano do protagonista. Neste ato, surge um problema e o herói, inicialmente, recusa o chamado à aventura. Depois acontece uma ajuda sobrenatural ou um encontro com um mentor, e o personagem faz a travessia do primeiro limiar, tendo suas primeiras provações no que Campbell chama de barriga da baleia.
- Mundo cotidiano
- Chamado à aventura
- Recusa do Chamado
- Ajuda Sobrenatural
- Travessia do Primeiro Limiar
- Barriga da baleia
- Iniciação: é o núcleo da história, no qual o herói enfrenta uma estrada de provas e encara a sua maior crise, geralmente enfrentando a morte ou alguma grande perda. Ao final, ocorre uma nova batalha e a apoteose, a grande conquista.
- Estrada de Provas
- Encontro com a Deusa
- A Mulher como Tentação
- Sintonia com o Pai
- Apoteose
- A Grande Conquista
- Retorno: com a recompensa pela grande conquista, o herói inicialmente reluta em voltar para a sua antiga normalidade. Depois de realizar um resgate interior, no entanto, faz novamente a travessia do limiar. E retorna para casa, agora senhor de dois mundos.
- Recusa do Retorno
- Voo Mágico
- Resgate Interior
- Travessia do Limiar
- Retorno
- Senhor de Dois Mundos
- Liberdade para Viver
Como aplicar a jornada do herói em suas histórias
A melhor maneira de aplicar a estrutura narrativa da jornada do herói ao seu storytelling é concentrar-se nos três atos principais. Partida, iniciação e retorno.
Você pode sempre começar um conteúdo contando uma história de uma situação de normalidade que requer algum tipo de mudança.
Depois, desenvolver as provações que podem levar a tal mudança.
E por fim, apresentar o resultado, o novo patamar a que se chegou quando os desafios foram vencidos.
Dependendo do seu nicho de mercado, a melhor forma de fazer isso é contando superações próprias. Isso tem funcionado muito bem para projetos que lidam com desafios pessoais.
Não é por acaso que tantos sites de emagrecimento, ganho de massa muscular, aprovação em concurso público ou até mesmo de criação de negócios vêm se dando tão bem com o uso das técnicas de storytelling aplicadas ao marketing de conteúdo.
Não sendo o caso de histórias próprias, procure utilizar casos reais de personagens parecidos (ao menos no primeiro ato) com as características da persona que você definiu na Tarefa #3.
Como última opção, mas não menos impactante, você pode criar histórias fictícias que sirvam para ilustrar o seu ponto.
Se a história for bem contada, personagens fictícios podem gerar tanta conexão quanto os reais. Ou até mais. É só ver o exemplo de Star Wars, dos heróis dos quadrinhos, das princesas da Disney.
Como aprender storytelling como um verdadeiro mestre
Muita gente acredita que saber contas histórias é um dom. Ou você tem ou você não tem.
Escrevi sobre esse mito detalhadamente no post Como ser criativo mesmo sem nenhum talento ou dom especial: 12 técnicas infalíveis lá no Mude.vc.
Trata-se de um artigo longo, mas em resumo o que expliquei foi que criatividade não é um dom inato. É uma habilidade que, como qualquer outra, requer estudo e prática para ser desenvolvida.
Então, o roteiro básico para aprender a contar histórias incríveis é:
- Estudar o básico sobre storytelling: leia os livros de Joseph Campbell e outros mais recentes sobre o tema.
- Ler boas histórias: procure os grandes clássicos, as obras que sobreviveram ao teste do tempo. Se você não gosta de ler (caminho errado), procure assistir a bons filmes. Fique atento para perceber as estruturas narrativas que sempre são utilizadas.
- Praticar repetidamente: para cada conteúdo que for produzir, procure pelo menos começar contando uma história. Mesmo que as primeiras tentativas sejam frustradas, com o tempo e a prática o desenvolvimento será natural.
Na próxima aula do curso, vamos ver como criar uma estrutura básica para abrigar tudo o que você já fez até aqui na etapa de produção de conteúdo.
Plano de Ação 3.3
Ao final de cada aula do curso Presença Digital de Zero a Dez, ofereço uma série de tarefas específicas para você executar.
A ideia é não ficarmos apenas na teoria, mas partirmos para transformar, na prática, projetos em realidade.
As tarefas estão numeradas de forma sequencial desde a primeira aula, para que alguém que chegue no meio da jornada possa se localizar com facilidade.
Tarefa #23: Escolha uma história para contar
Nas últimas tarefas da etapa Produzindo Conteúdo, começamos a elaborar uma planilha e um checklist. Eles servirão para orientar a criação dos novos conteúdos do seu projeto.
O próximo item, depois da pesquisa de palavras-chave, é a escolha de uma história para contar.
Isso não significa que você já vai começar a escrever a história, mas simplesmente escolher uma. Ou pelo menos escolher se vai ser uma história pessoal, um caso real de terceiros ou uma ficção que ilustre o seu tema.
Então, pegue a planilha e acrescente o campo “História a ser contada”. Pegue o checklist e acrescente o item “Escolher a história a ser contada”.
Bibliografia deste artigo
Livro #19: O Herói de Mil Faces, de Joseph Campbell
O Herói de Mil Faces, de Joseph Campbell, é o livro fundamental e imprescindível para quem quer começar a estudar storytelling.
Como falei ao longo da aula, foi o trabalho de Campbell, publicado em 1949, que trouxe a atenção de especialistas e estudiosos para as estruturas narrativas que sobrevivem ao tempo.
Não por acaso, o livro foi considerado pela Revista Time como um dos 100 mais influentes já escritos em língua inglesa.
Livro #20: A Jornada do Escritor, de Christopher Vogler
Em A Jornada do Escritor, Christopher Vogler faz uma atualização das teorias de Joseph Campbbell, em um trabalho inicialmente encomendado para a Disney.
Vogler havia estudado na mesma faculdade de cinema de George Lucas e admirava o trabalho de Campbell. Ele fez circular no estúdio do Mickey um memorando de sete páginas. O título era “Um guia prático para o Herói de Mil Faces”.
O texto fez tanto sucesso que foi desenvolvido para se tornar o livro. Embora voltada para roteiristas de cinema, a obra é de grande valia para qualquer produtor de conteúdo.
Se os exemplos de Campbell são de figuras antigas e religiosas, no livro de Vogler são personagens modernos. De Star Wars a animações da Disney. Uma leitura bem mais fácil para os dias atuais.
Livro #21: Nocaute – Como Contar Sua Historia no Disputado Ringue das Redes Sociais, de Gary Vaynerchuk
Se você não conhece, Gary Vaynerchuck é um empreendedor americano famosíssimo por seu modo não convencional de criar negócios. E atrair pessoas para eles usando as mídias sociais.
Em Nocaute, ele explica em detalhes as estratégias que tem utilizado para contar histórias. Também explica como elevar sua marca pessoal e praticar marketing de conteúdo.
Um livro bem atual sobre como usar as histórias em um mundo barulhento, distraído e cheio de redes sociais.